│Dever de Informar
Todo profissional da área da saúde, como médicos, dentistas, esteticistas ou quaisquer outros, devem, de forma clara e precisa, orientar seus pacientes antes de qualquer procedimento cirúrgico ou tratamento aplicado.
Trata-se de uma obrigação legal, disposta na Resolução nº 2.217/18 (Código de Ética Médico) nos artigos 22, 24 e 34; no art. 15 do Código Civil; nos artigos 6o., 8o. e 9o. do Código de Defesa do Consumidor; art. 6o. da Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos; no art. 5o. inciso XIV da Constituição Federal de 1988; enfim, trata-se de uma obrigação que, se descumprida, gera responsabilidade civil e direito à restituição por danos morais, caso fique configurada a culpa por lesão.
Essa orientação deve respeitar momento, condição e local mais adequados ao paciente para que o esclarecimento respeite sua privacidade. Deve ser feita de forma clara e acessível, respeitando a cultura, faixa etária, condição socioeconômica e autonomia do paciente.
Além disso, é preciso conceder o tempo adequado para que o paciente possa refletir, a fim de poder consultar seus familiares ou outras pessoas que possam ajudá-lo a decidir se deve ou não se submeter ao procedimento proposto pelo profissional de saúde.
Trata-se de uma obrigação legal do profissional da saúde que tem por objetivo respeitar a autonomia do paciente, de modo que esteja ciente de suas condições como sujeito de procedimentos de saúde considerados invasivos.
Essas informações devem conter, obrigatoriamente:
- os motivos, objetivos, duração e métodos específicos a serem usados no procedimento de saúde em questão;
- explicitação dos possíveis desconfortos e riscos decorrentes do procedimento, além dos benefícios esperados e das providências e cautelas a serem empregadas para evitar e/ou reduzir efeitos e condições adversas que possam causar dano;
- esclarecimento sobre a forma de acompanhamento e assistência a que o paciente terá direito (durante e após o procedimento), considerando os benefícios e os riscos que o paciente estará sujeito caso não se submeta ao acompanhamento;
- orientação sobre as consequências (ou não), caso o paciente se recuse a dar continuidade ao tratamento, seja qual for a fase no qual se encontre;
- explicitação da garantia (ou não) à reparação em função de eventuais danos decorrentes do tratamento e em quais condições essa será cabível.
│Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Concordando o paciente com o tratamento proposto, após as devidas orientações, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) deve ser redigido pelo profissional de saúde, lido e compreendido pelo paciente, o qual deverá assinar o documento atestando sua concordância com o tratamento.
Este documento deve conter, obrigatoriamente, todos os itens já mencionados, além de outros mais que sejam relevantes para o caso.
O profissional de saúde de redigirá o documento também deverá respeitar os seguintes princípios:
- o documento não pode ser genérico para qualquer tipo de procedimento;
- o documento deve ser assinado com antecedência mínima, antes do procedimento;
- o profissional deve garantir que o paciente receberá uma via do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido;
- a redação do documento deve ser feita em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo paciente;
- o documento deve conter declaração do paciente de que está devidamente informado e esclarecido acerca do procedimento, e de que é livre para não consentir com a intervenção, sem qualquer penalização ou prejuízo a seu cuidado.
│Negligência Informacional
Caso o paciente não seja informado sobre todos os riscos, condições e tratamento a que será submetido, fica caracterizada negligência informacional por parte do profissional de saúde. Embora não se enquadre no chamado “erro médico”, trata-se de falha na prestação de serviços, cuja incidência é passível de indenização, pois viola direito personalíssimo do paciente quando lhe privado o livre consentimento.
Simplesmente dizer que o paciente corre “riscos”, de forma genérica, diante de um procedimento, não é suficiente para que o profissional de saúde cumpra com seu dever de informar.
Infelizmente, muitos médicos requerem assinatura do paciente no TCLE somente quando o paciente está prestes a entrar na sala de cirurgia. Em se tratando de cirurgia eletiva (marcada com antecedência) isto é inadmissível, pois caracteriza coação. O paciente deve ter tempo suficiente para refletir se realmente deseja se submeter às possíveis consequências explicadas no termo.
Também há procedimentos que exigem legalmente, tempo específico para que o paciente possa decidir. No caso de uma histerectomia, (retirada do útero), o termo deve ser assinado pela paciente com no mínimo 60 dias de antecedência, conforme consta no art. 10, (caput e inciso I) da Lei nº 9.263/96.
Ainda falando sobre histerectomia, é preciso lembrar que não cabe mais exigir anuência do marido (para esterilização), posto que desde o dia 01/03/23 vigora a Lei 14.443/22 que revogou o §5º do Art. 10 da Lei 9.263/96, o qual previa que: “Na vigência de sociedade conjugal, a esterilização depende do consentimento expresso de ambos os cônjuges”. Ou seja, já não há mais qualquer obrigação legal do esposo da paciente em anuir quanto à esterilização da esposa.
Portanto, exigir a assinatura do esposo em caso de histerectomia como forma de consentimento da esposa, ou captar a assinatura da esposa sem respeitar o tempo legal torna o TCLE nulo.
│Respresentante Legal
A informação médica deve ser dada ao paciente, e somente ao paciente, de modo que este possa tomar a decisão que melhor lhe convir. As únicas exceções são quando este é incapaz, (quando o representante legal toma a decisão), ou quando o paciente possui discernimento comprometido, ainda que por breve momento, de modo a não poder exprimir sua vontade, quando o acompanhante pode opinar sobre procedimento médico.
Neste último caso, quem toma a decisão final é o médico, (numa cirurgia de emergência por exemplo). Em outras palavras, as exceções à exigência de TCLE sempre dependerão da ausência de Representante Legal concomitantemente à:
- Incapacidade do paciente;
- Emergência com risco de morte, com tempo inadequado para obter o consentimento do Representante Legal;
- Incapacidade do paciente de tomar decisões, após avaliação de um psiquiatra.
Entretanto, muitos médicos utilizam o Código de Ética Médica (art. 22), para justificar a legalidade da assinatura do cônjuge no TCI, classificando-o como Representante Legal, o que não se enquadra em nenhuma das hipóteses já explicitadas, violando o direito de autonomia da vontade do paciente.
Para que o esposo seja representante legal da esposa, esta deve ser declarada incapaz perante à justiça, e o esposo deve ser considerado seu curador. Fato que raramente ocorre.
Neste viés, o TCLE é nulo, pois conforme já dito, requer a assinatura do paciente, e somente deste.
│Fraude
Como a falta de comprovação de que o médico orientou o paciente de forma clara e específica sobre o procedimento, enseja responsabilidade civil, (com dever de indenizar) caso fique comprovado lesão decorrente do procedimento, não é incomum, infelizmente, o surgimento de documentos fraudados. São documentos genéricos que possuem assinatura de outros, (ou mesmo do próprio cônjuge), mas que têm data anterior à que se deu a assinatura do paciente ou “representante legal”.
Por motivos óbvios, trata-se de documento nulo. Como já enfatizado, o TCLE deve ser assinado com antecedência suficiente ao procedimento, para que não fique configurada coação do paciente, e que possa ter tempo para tomada de decisão.
- Robson Carmona
- Data: 31/10/2023